Aqui posto de comando do Movimento das Palavras Armadas.

terça-feira, julho 21, 2009

Guerra Junqueiro



Em 1896, Guerra Junqueiro descreveu-nos em a “Pátria” desta forma impiedosa e sarcástica. A nós, os Portugueses! Porque Guerra Junqueiro foi uma extraordinária personalidade da transição do século XIX para o século XX e a sua obra literária é uma referência da cultura portuguesa, propomos-lhe uma leitura atenta e crítica.

Afinal, o “assunto” é sobre nós, os Portugueses, e o nosso “carácter”:

Um povo em catalepsia ambulante, não se lembrando nem donde vem, nem onde está, nem para onde vai; um povo, enfim, que eu adoro, porque sofre e é bom, e guarda ainda na noite da sua inconsciência como que um lampejo misterioso da alma nacional, reflexo de astro em silêncio escuro de lagoa morta.

Uma burguesia, cívica e politicamente corrupta até à medula, não discriminando já o bem do mal, sem palavras, sem vergonha, sem carácter, havendo homens que, honrados na vida íntima, descambam na vida pública em pantomineiros e sevandijas, capazes de toda a veniaga e toda a infâmia, da mentira à falsificação, da violência ao roubo, donde provém que na política portuguesa sucedam, entre a indiferença geral, escândalos monstruosos, absolutamente inverosímeis no Limoeiro.

Um poder legislativo, esfregão de cozinha do executivo; este criado de quarto do moderador; e este, finalmente, tornado absoluto pela abdicação unânime do País. A justiça ao arbítrio da Política, torcendo-lhe a vara ao ponto de fazer dela saca-rolhas.

Dois partidos no governo sem ideias, sem planos, sem convicções, incapazes, vivendo ambos do mesmo utilitarismo céptico e pervertido, análogos nas palavras, idênticos nos actos, iguais um ao outro como duas metades do mesmo zero, e não se malgando e fundindo, apesar disso, pela razão que alguém deu no parlamento, de não caberem todos duma vez na mesma sala de jantar.”



Guerra Junqueiro, “Pátria”, 1896.



Nós, os portugueses, mais de cem anos depois, continuaremos assim como nos considerava Guerra Junqueiro?



1 comentário:

gaspar disse...

Sim, no essencial continuamos a ser os mesmos.
Entre o mais ou menos e o tem de se feito. O logo se vê e o não há qualquer dúvida. Fica para amanhã e o ontem já era tarde.
Onde é que nós, os portugueses, estamos? Na decisão ou na espera?
Na descoberta do caminho marítimo para a Índia ou em Alcácer Quibir?