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quarta-feira, março 04, 2009

Besancenot


Um jovem carteiro trotskista tornou-se no líder da contestação em França. Aclamado em sondagens como o principal opositor a Sarkozy, fundou há semanas um novo partido anticapitalista, apostado em transformar a revolta em revolução No início da semana passada, Olivier Besancenot fazia a sua primeira aparição pública enquanto "porta-voz" do Novo Partido Anticapitalista para apoiar os protestos nas Antilhas francesas contra o aumento do custo de vida. Entre mais de mil manifestantes concentrados em Paris, o militante trotskista de 34 anos, admirador de Che Guevara e que nunca escondeu a vontade de encabeçar um novo Maio de 68, apelava o país a revoltar-se, "seguindo o exemplo" dos franceses da Guadalupe.

Se até há alguns meses o mesmo discurso limitava-se a confirmar a simpatia dos franceses por este revolucionário com ares de jovem sacristão, desde o estalar da crise financeira internacional, as intervenções do militante de extrema-esquerda têm mais impacto junto da opinião pública do que as dos líderes da oposição socialista.

O discreto carteiro da localidade "burguesa" de Neuilly-sur-Seine, governada durante 18 anos por Nicolas Sarkozy, actual Presidente da República, tornou-se nos últimos meses no principal mensageiro da revolta contra "as derivas da globalização financeira", pronto a devolver ao remetente as reformas "neoliberais" do Presidente conservador.

Depois de a sua candidatura às presidenciais em 2002 e 2007 ter recolhido 4% de votos - os melhores resultados de sempre do seu partido, a Liga Comunista Revolucionária (LCR) - Besancenot conta hoje com o apoio de 10% do eleitorado francês.

Uma popularidade crescente e duplamente incómoda: inquieta, à esquerda, os socialistas tentados pela via liberal, e à direita, os conservadores criticados por descurarem as políticas sociais.

As polémicas em torno de Besancenot, sobre a sua relação com um dirigente de um antigo grupo armado ou sobre a sua proximidade com um alegado grupo de extrema-esquerda acusado de sabotar as linhas de caminho-de-ferro, ilustram o nervosismo do Governo, acusado, no entanto, de beneficiar do "efeito Besancenot" para enfraquecer a oposição socialista, aliás cada vez mais fragmentada por múltiplos conflitos internos.

Ciente da necessidade de renovar a imagem do seu campo político, Besancenot dissolveu em Fevereiro a LCR para dar à luz o Novo Partido Anticapitalista (NPA). A formação que milita por "um socialismo do século XXI" conta já com nove mil militantes, o triplo dos apoiantes da quadragenária LCR.

Mantendo os ideais marxistas, o programa do NPA prevê a proibição dos despedimentos, a criação de um serviço bancário público auto-gerido pelos trabalhadores, o aumento do salário mínimo para 1500 euros e a generalização dos contratos sem termo.

À imagem do militante anti-racista e antiglobalização ao guiador de uma bicicleta dos correios, o partido pretende somar a partir de agora a "esquerda da esquerda" em torno de propostas como a regularização dos imigrantes clandestinos, o realojamento dos sem-abrigo e a aposta nas energias renováveis.

Vinte anos após a queda do muro de Berlim ter aberto as portas à globalização, a cotação das utopias parece ter saído do "vermelho" face ao desmoronamento dos mercados financeiros que se tem registado nos últimos seis meses um pouco por toda a parte.

O homem que quer "radicalizar a democracia" e "pôr fim às injustiças do sistema capitalista", apresenta-se como um jovem dos subúrbios, mais do que como um proletário. Se nos anos 80 se escondia sob o pseudónimo revolucionário de 'Lucien', hoje não rejeita a mediatização, tendo batido em audiência a socialista Ségolène Royal, quando aceitou substituí-la, em Abril, num dos programas mais populares da televisão pública.

A provável candidatura de Besancenot às presidenciais de 2012, onde será um dos rivais do actual Chefe do Estado, Nicolas Sarkozy, arrisca-se a alimentar a longa lista de excepções francesas, depois da vitória da extrema-direita na primeira volta das eleições em 2002, com Jean-Marie Le Pen como candidato, e da incómoda vitória do 'Não' no referendo ao Tratado Europeu em 2005, que teve repercussões muito para lá das fronteiras francesas.

Resta saber se a classe política gaulesa chegará a compreender a mensagem antes de decidir atacar este mensageiro.

in DN

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